Década da moda e da música
A década de 1960 foi um período de intensas transformações que moldaram a sociedade contemporânea. Marcada por movimentos sociais, avanços nos direitos civis e uma onda de contracultura, essa era testemunhou uma estreita ligação entre a música e a moda. Artistas e bandas não apenas criaram novas sonoridades, mas também influenciaram profundamente o modo de vestir de uma geração que buscava expressar suas ideias e identidade.
Pela vastidão de assuntos e referências de moda neste década maravilhosa, vamos dividir por assunto. Neste post, exploraremos em detalhes os principais movimentos musicais e fashionistas, bem como as personalidades que deixaram um legado duradouro na interseção entre música e moda nos anos 60.
A Invasão Britânica e o Movimento Mod
O início dos anos 60 foi dominado pela chamada Invasão Britânica, quando bandas britânicas conquistaram o cenário musical internacional. O Movimento Mod (abreviação de “modernist”) emergiu em Londres, caracterizado por uma estética sofisticada e futurista. Os Mods adotavam ternos bem cortados, gravatas finas e sapatos elegantes, inspirados no estilo italiano. A música era central nesse movimento, com bandas como The Who, The Kinks e Small Faces liderando o som Mod, que combinava rock, R&B e pop.
The Who, em particular, desempenhou um papel fundamental não apenas no cenário musical, mas também no mundo da moda. Conhecidos por sua energia explosiva no palco e atitude rebelde, os membros da banda incorporaram elementos visuais que representavam a identidade Mod de forma marcante. Pete Townshend, guitarrista do The Who, frequentemente usava jaquetas militares decoradas com o símbolo da Força Aérea Britânica além de ternos justos e botas Chelsea, que se tornaram peças emblemáticas do movimento. A banda também ajudou a popularizar o uso de parkas, que se tornaram um item essencial para os Mods, especialmente em suas icônicas reuniões de scooters.
O estilo ousado do The Who ajudou a consolidar a imagem dos Mods como um grupo sofisticado, mas cheio de atitude, e influenciou diretamente a moda jovem, conectando a música com uma identidade visual clara e provocadora.
A moda feminina também foi revolucionada pelo estilo Mod. A estilista Mary Quant popularizou a minissaia, um item que se tornou símbolo de liberdade, rebeldia e emancipação feminina, permitindo às mulheres uma expressão mais ousada e desafiando as normas conservadoras da sociedade. A modelo Twiggy, com seu corte de cabelo curto, olhos marcantes e cílios exagerados, tornou-se o ícone feminino do movimento, representando a juventude e a modernidade dos anos 60. Twiggy não apenas popularizou a minissaia, mas também ajudou a difundir a estética andrógina, que misturava traços femininos e masculinos de uma maneira nunca vista antes.
O estilo Mod enfatizava padrões geométricos, cores vibrantes e uma silhueta jovem e ágil, refletindo o otimismo, a inovação e a energia criativa da época. Esse movimento também tinha um forte componente de acessibilidade, pois as roupas Mod eram relativamente simples e baratas de produzir, tornando-as acessíveis a um público mais amplo e reforçando a democratização da moda.
Psicodelia e Contracultura Hippie
A partir de meados da década, a contracultura hippie ganhou força, especialmente nos Estados Unidos. A psicodelia, influenciada pelo uso de substâncias alucinógenas, trouxe novas experimentações sonoras e visuais. Bandas como Grateful Dead, Jefferson Airplane e The Jimi Hendrix Experience exploraram sons complexos e expansivos.
Na moda, isso se traduziu em estampas psicodélicas com cores intensas e padrões caleidoscópicos. Roupas fluidas, túnicas indianas, calças boca de sino e vestidos longos eram populares. A influência de culturas orientais e nativas americanas era evidente, com o uso de acessórios como colares de contas, pulseiras e penas. O estilo hippie representava a rejeição aos valores tradicionais e a busca por paz, amor e harmonia com a natureza.
Movimento Folk e Protesto
O movimento folk, com artistas como Bob Dylan, Joan Baez e Peter, Paul and Mary, tornou-se a trilha sonora dos protestos e lutas sociais. Suas músicas abordavam temas como direitos civis, igualdade e oposição à Guerra do Vietnã. O estilo musical simples e acústico refletia-se na moda: roupas práticas e despojadas, como jeans, camisas xadrez, coletes e botas.
A moda folk valorizava materiais naturais e uma estética sem adornos excessivos, trazendo uma conexão com as raízes culturais e o espírito de simplicidade. Tecidos como algodão e linho eram predominantes, e muitas roupas eram feitas à mão ou tinham aparência artesanal, o que conferia um caráter único e pessoal a cada peça. Símbolos de paz, bottons com mensagens políticas e faixas na cabeça eram comuns, representando o forte desejo por mudanças sociais e a busca por um mundo mais justo.
Esse estilo refletia a autenticidade e o engajamento político dos artistas e seus seguidores, demonstrando como a moda podia ser uma extensão das convicções pessoais e do ativismo. A estética folk também ressoava com a música da época, transmitindo a ideia de que a moda deveria ser inclusiva, acessível e uma expressão genuína dos valores individuais e coletivos. O uso de peças como coletes de pele falsa, vestidos soltos e botas desgastadas também ajudava a construir uma imagem que rejeitava o consumismo exacerbado e valorizava o contato com a natureza e a cultura popular.
Soul, Direitos Civis e Orgulho Negro
O movimento pelos direitos civis nos Estados Unidos teve na música soul um poderoso aliado. Artistas como Aretha Franklin, James Brown, Otis Redding e Marvin Gaye deram voz às aspirações e lutas da comunidade afro-americana. Músicas como “Respect” e “Say It Loud – I’m Black and I’m Proud” tornaram-se hinos de empoderamento.
Na moda, houve uma afirmação da identidade negra através de penteados naturais, como o black power, e roupas que celebravam a cultura africana. Vestidos elegantes, ternos sob medida e acessórios sofisticados mostravam orgulho e resistência. A moda tornou-se um ato político, rejeitando os padrões eurocêntricos e promovendo a autoaceitação.
Rock Psicodélico e Experimentação
Bandas como Pink Floyd, The Doors e The Velvet Underground desafiaram convenções musicais com sons experimentais e letras introspectivas. O rock psicodélico incorporava elementos de jazz, música clássica e efeitos sonoros inovadores.
A moda associada a esse movimento era igualmente experimental. Roupas com estampas abstratas, tecidos metálicos e cortes não convencionais eram usados. A estética andrógina também ganhou espaço, com homens e mulheres compartilhando estilos semelhantes. Essa abordagem representava a quebra de barreiras e a exploração de novas formas de expressão.
Janis
Conhecida por sua voz potente e emotiva, Janis Joplin tornou-se um ícone da contracultura e uma das figuras mais emblemáticas do movimento hippie. Seu estilo pessoal refletia sua personalidade livre e rebelde, transmitindo uma autenticidade que conquistou muitos fãs. Ela frequentemente usava roupas de inspiração vintage, como vestidos longos e esvoaçantes, peles falsas e muitas joias exuberantes, que simbolizavam sua atitude despreocupada e seu espírito irreverente.
Seus óculos redondos coloridos, muitas vezes em tons vibrantes como roxo e rosa, juntamente com seus cabelos desgrenhados, tornaram-se marcas registradas que ajudavam a construir sua imagem de liberdade e rebeldia. Janis também era conhecida por usar acessórios artesanais, como colares de contas e anéis grandes, que transmitiam sua ligação com a estética boêmia e a valorização do artesanato.
Ela desafiava os padrões tradicionais de feminilidade, rejeitando a ideia de um visual polido e abraçando uma estética que era, ao mesmo tempo, crua e cheia de significado. Seu visual representava uma forma de resistência às normas sociais da época, enfatizando o poder da individualidade e a liberdade de ser quem se é, sem concessões.
The Rolling Stones
The Rolling Stones foram uma das bandas mais importantes dos anos 60, tanto em termos musicais quanto no impacto que tiveram na moda e no comportamento da época. Conhecidos pelo seu estilo rebelde e descompromissado, os Rolling Stones traziam uma atitude que contrastava diretamente com a imagem mais polida dos Beatles no início da década. Mick Jagger, com sua presença de palco carismática e movimentos inconfundíveis, era também um ícone de estilo. Ele costumava usar camisas de seda, calças justas e jaquetas coloridas, criando uma mistura de glamour com um toque de ousadia sexual que definia o visual da banda. O estilo de Jagger era eclético e, muitas vezes, desafiava as normas de gênero da moda, abraçando elementos andróginos que ecoavam o espírito de experimentação e liberdade da época.
Além de Mick Jagger, Marianne Faithfull teve um papel crucial na influência estética do grupo. Marianne, cantora e atriz, foi também companheira de Jagger durante parte dos anos 60, e tornou-se uma musa da moda e do rock. Ela misturava elementos do estilo boêmio com peças sofisticadas, frequentemente aparecendo em jaquetas de couro, botas altas e vestidos de renda. Seu visual encapsulava a dualidade dos anos 60 — ao mesmo tempo elegante e rebelde. Faithfull também era conhecida por seu estilo despojado e natural, que, junto ao seu envolvimento com a cena musical e a atitude provocativa, ajudou a definir a estética da contracultura britânica.
The Beatles
Originários de Liverpool, The Beatles foram fundamentais na definição da música e da moda dos anos 60. Inicialmente, adotavam ternos alinhados e cortes de cabelo característicos, influenciando o estilo Mod e criando uma estética que era ao mesmo tempo elegante e acessível para a juventude. Esses ternos, inspirados no designer Pierre Cardin, ajudaram a solidificar a imagem dos Beatles como ícones de estilo no começo da década. Com o tempo, o visual da banda evoluiu para algo muito mais experimental, incorporando influências psicodélicas e orientais, refletindo o espírito de contracultura que dominava a época. Eles começaram a usar roupas coloridas, estampas florais, túnicas e acessórios que evocavam uma estética espiritual e livre.
O álbum “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band” exemplifica essa evolução estética, com seus uniformes militares estilizados, cores vibrantes e elementos decorativos barrocos, que capturavam a essência do movimento psicodélico.
A relação de John Lennon com Yoko Ono também desempenhou um papel importante nessa transformação. Yoko, uma artista de vanguarda, influenciou profundamente o estilo de Lennon, levando-o a adotar uma estética mais minimalista e conceitual. Peças em branco, roupas fluidas e uma abordagem mais artística e ativista passaram a definir sua imagem. Yoko e John usavam a moda como uma forma de protesto e de expressão política, especialmente em eventos como o famoso ‘Bed-In for Peace‘, onde apareceram vestidos de branco, simbolizando paz e pureza. A influência de Yoko Ono não apenas impactou Lennon, mas também contribuiu para a fase mais madura e politicamente engajada dos Beatles, em que a moda era usada para transmitir mensagens de paz e amor, conectando diretamente a música com os movimentos sociais da época. Em 1971, John lança Imagine.
Festivais de Música (e de Moda)
Os grandes festivais dos anos 60 foram mais do que eventos musicais — eles se tornaram verdadeiros palcos de expressão fashion, onde a juventude pôde experimentar e afirmar seu estilo de forma ousada e livre. A moda nesses festivais era uma extensão da atitude dos participantes, refletindo o espírito de rebeldia, liberdade e contracultura que caracterizava a década. Esses eventos não apenas moldaram a música, mas também estabeleceram tendências que seriam seguidas pelo mundo todo.
Janis no Monterey Pop Festival (1967)
Jimi Hendrix – Woodstock (1969)
Trailer do filme Gimme Shelter (1970) que mostra o polêmico concerto dos Rolling Stones em Altamont, California 1969
A música e a moda dos anos 60 no Brasil
A moda e a música dos anos 60 no Brasil também desempenharam um papel crucial durante esse período de transformações sociais e culturais. Com a ascensão da Tropicália, um movimento cultural que desafiou a censura e o autoritarismo, a música brasileira passou a dialogar diretamente com o universo fashion, refletindo o desejo de liberdade e inovação. Artistas como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa e Os Mutantes não só revolucionaram a música, mas também a moda, trazendo uma estética que misturava elementos tradicionais brasileiros com influências internacionais, criando uma fusão única de cores, padrões e estilos.
A Tropicália introduziu ao Brasil uma nova maneira de enxergar a moda como um manifesto político, em que trajes extravagantes, estampas tropicais, e uma mescla de peças tradicionais e contemporâneas se tornavam formas de expressão contra a repressão. Caetano Veloso e Gal Costa frequentemente usavam roupas que quebravam as normas de gênero e abraçavam a diversidade, promovendo uma estética visual que incentivava a liberdade pessoal e a criatividade, alinhada à música provocativa e às letras engajadas.
Nara Leão também se destacava na música e na moda. seu estilo refletia a juventude intelectual da época, alinhada com movimentos culturais e políticos. Nara incorporava elementos que simbolizavam liberdade e modernidade, tornando-se referência para uma geração que buscava mudanças sociais.
Gil e Os Mutantes no Festival de Record (1967)
Fique sabendo antes
Insira seus dados abaixo para receber novidades e conteúdos exclusivos da Cora!